terça-feira, 6 de novembro de 2007

ROSAS

Da cadeira de balanço que ficava no patamar da entrada da casa via-se a chuva criadeira lavando o jardim. As plantas pareciam alertas.Bromélias,palmeiras,jasmins ,marias-sem-vergonha ,todas sorriam um verde vivo. Só a velha senhora não se sentia fortalecida pela magia que caía do céu em gotas. De repente as folhas de uma bromélia pareciam de ouro!O que seria?Parecia fogo. Outras folhas iniciaram aquele processo de luminosidade e isso aguçou os sentidos da mulher que tomada de vibração levantou-se devagarinho com medo de quebrar o encanto daquele momento e daquelas plantas vaga-lumes. Que espetáculo! folhas verdes em brasa!Lindo!


E tudo porque a lâmpada do poste começava a realizar sua rotineira tarefa de substituir a luz fugidia do sol que teimava em acompanhar o chuvisco.


_Será que isso acontecia sempre que chovia à tardinha?E porque razão ela não notara das outras vezes? Era preciso estar mais atenta aos mágicos espetáculos da natureza. O que a havia distanciado das belezas da vida?Em que instante perdera a capacidade de sonhar?


Quando menina encantava-se com as flores e os animais.


Houve uma época em que ela e a Gringuinha adoravam brincar de esconde-esconde no pomar e

depois sentarem no jardim para escolher as flores que enfeitariam os vasos da sala. Gringuinha era assim chamada por causa de seu cabelo loiro e as rosas eram as suas prediletas.



As famílias eram vizinhas e as meninas gozaram de um saudável companheirismo pontilhado de afetos e sorrisos até aquele dia. O dia em que tudo mudou.


Todos pareciam calados e tristes e sussurrando pelos cantos.


-Que aconteceu?


_Nada , menina.


_Vá vestir-se para visitar sua avó!


-Depressa , Juliana!





Ficou dois dias na casa da avó e retornou desejosa de rever Gringuinha . Mas ela estava viajando , foi o que lhe disseram.Que pena!


Quando entrava na cozinha certa tarde ouviu mamãe falando com a empregada:

_Ela não resistiu , morreu esta madrugada. Pobre criança!

As duas mulheres limparam furtivamente as lágrimas e mudaram de assunto ao vê-la.


De quem elas falavam? Ia perguntar,mas foi atraída pela buzina do carro de tia Zulma e ela trazia a prima Angélica. Ficaram uma semana de visita.

Após a partida das hóspedes, na hora da sesta de papai ,Juliana costumava sentar-se no jardim e naquele dia viu com alegria que Gringuinha voltara. Correu para a amiga e esta escondeu-se atrás do jasmineiro.Depois fugiu dando risadas.E assim ,por vários dias,brincaram de esconde-esconde enquanto os adultos dormiam.Mas a amiguinha estava diferente:corria,pulava,sorria e muito pouco falava. Juliana insistia:

_Vem ver a mamãe!

E Gringuinha não ia. Até o dia que , cansada da insistência da amiga , explicou:

-Não posso falar com tua mãe. Estou morta.

Juliana não gostou da brincadeira e retrucou:

_Assim não vale ,não brinco mais! E entrou em casa furiosa.

No dia seguinte Gringuinha só abanou para ela e desapareceu atrás da roseira.



À noite, quando foi deitar-se,Juliana viu uma linda rosa em cima da cama.Pegou o vasinho da sala e enfiou nele,colocando-o sobre o criado-mudo. Desse dia em diante, toda vez que Gringuinha se escondia atrás da roseira,uma rosa aparecia em seu quarto.

Naquele ano ela começou a freqüentar a escola e deixou de ir ao jardim no horário de sesta.Novas coleguinhas entraram em sua vida e ela esqueceu-se de Gringuinha.Esqueceu-se ,mas de vez em quando ainda recebia uma rosa.

Isso durou até quando? Juliana não sabia mais...



E agora tudo lhe voltava à lembrança. Levantou-se da cadeira de balanço e foi procurar aquele vasinho de sua infância que guardara na estante do sótão. Limpou-o e recolocou na mesinha de cabeceira.

Quem sabe , Gringuinha depositaria ali uma rosa?....

Nenhum comentário: